Da Angola para o Brasil, Ondjaki universaliza seus textos com personagens infantis e sensíveis ao debaterem assuntos sociais. O autor formado em sociologia é também artista plástico. Vencedor de diversos prêmios, foi laureado pelo Grande Prêmio de Conto Camilo Castelo Branco pelo livro “Os da Minha Rua” e, na Etiópia, ganhou o prêmio Grinzane na categoria de melhor escritor africano. Além disso, no Brasil venceu o Prêmio Jabuti na categoria juvenil.

Ondjaki na sessão de autógrafos da 8ª Jornadinha Nacional de Literatura | Foto: Lucas Santos – NEXJOR FAC UPF
Um dos desafios em enfrentar os problemas sociais hoje, seja em âmbito familiar, profissional ou relacionado a problemas públicos, é o de saber ouvir as outras pessoas, tanto adultos quanto crianças. “Sabemos que quem resolve os problemas em uma cidade, em um país, são adultos, mas também quem cria os problemas, as guerras, são os adultos. Acredito que seja uma questão de escutar todo mundo. Isso implica escutar a sociedade onde se está inserido”. Para Ondjaki não é preciso fazer diferenciação entre crianças e adultos, é preciso escutar ambos, afinal “é preciso escutar as pessoas e deixar elas participarem, sendo crianças ou não. (…). Se prestarmos atenção, as crianças falam de tudo, sobre todos os temas, as absorvem e falam sobre eles. As perspectivas da fala de uma criança são perspectivas válidas”, expõe.
No processo de produção de suas histórias, Ondjaki gosta de ouvir vozes de crianças que o acompanham quando está escrevendo. Por isso diversas vezes as histórias são narradas por crianças. Uma pessoa que faz da escrita a realização de um sonho, que transpassa tudo o que imagina para o papel. Um angolano que preserva em sua escrita expressões de sua terra. Para Ondjaki a língua é também “uma maneira de sonhar. Escrever é também sonhar. Só que a diferença é que, ao escrever, posso escolher um cadinho mais dos significados dos meus sonhos, então, quando estou a sonhar acontece qualquer coisa”.
“Escrever é também sonhar”
Em seus livros há uma personagem curiosa, a Avó Dezanove. Uma senhora carinhosa que está sempre a explicar as coisas de adulto para seu neto. Uma personagem baseada em sua própria avó.“Ela tem 102 anos, é viva e continua a beber seu copo de vinho na hora do almoço… e ainda tem só 19 dedos”, brinca. Ondjaki conta que gosta muito dos dois lados da personagem porque “a avó Dezanove é uma personagem fantástica, interessante. É uma senhora com muita ternura e muito engraçada. E por outro lado, a personagem real que é a minha avó é uma loucura de boa gente”, conta.
Ondjaki deixa um recado para seus leitores: “É preciso que cada um encontre um conjunto de livros que faça sentido para a sua vida. Não somos forçados a ler mil ou 5 mil livros, embora há quem leia 5 mil livros. Não somos forçados a nada. Eu acho que é bonito quando nós encontramos 1, 2, 5 mil livros que forem importantes. Não só para a nossa leitura, mas para a nossa vida. Livros, histórias que venham a fazer parte da nossa vida e essa é a ponte mais bonita entre a literatura e a realidade. A ponte mais bonita entre realidade e literatura não é quando o escritor que é do mundo real faz a literatura. Para mim a ponte mais bonita é quando a literatura encontra uma pessoa de verdade. Isso é quando a pessoa leva o livro, a literatura, para a sua vida, para os seus sonhos, para o seu dia-a-dia. Isso é bonito, acho que é um pequeno milagre, como diria Guimarães Rosa, é um pequeno milagre”, conclui.
More from 8º Jornadinha Nacional de Literatura
Os monstros de Mário Corso
O autor fez parte da mesa “Monstros e outros medos colecionáveis”, na última noite da Jornada Nacional de Literatura Mário Corso …